domingo, 23 de maio de 2010

A COERÊNCIA DO COMPORTAMENTO HUMANO


Certa manhã, após uma noite muito bem dormida, liguei a televisão e com uma rápida zapeada encontrei um desses programas de comportamento que se espalham pelas telinhas desse país.

A apresentadora era(é) uma dessas conhecidíssimas atrizes com talento, mas que, por motivos que desconheço, há algum tempo não aparece na programação.

Para facilitar a escrita e compreensão do texto a chamaremos de Lua.

Seu formato consistia(e) em blocos que, no estúdio, Lua iniciava relatando certa situação deixando no ar a pergunta:

Por que as pessoas reagem de determinada maneira perante a situação?

Nesse ponto, o programa ia para a rua onde apresentava as respostas de pessoas previamente escolhidas. Pareceram pessoas normais, encontradas aleatoriamente em pontos distintos da cidade. No caso em questão eram todos homens entre os quais consegui identificar um motorista de táxi.

Ouvidas as diversas respostas Lua voltava, apresentava suas conclusões e finalizava com sua opinião, algumas vezes seguida de um conselho.

E assim passavam-se os blocos, as situações, sempre sobre o mesmo tema, eram expostas enquanto Lua mostrava o como era(é) correta em suas reações.

Era a primeira vez que via esse programa e o tema versava em torno das manias do homem casado ou companheiro.

Achei interessante quando um dos entrevistados respondeu que não gostava de discutir a relação (um dos esportes prediletos de nossas queridas mulheres) porque isso significava momentos não muito agradáveis. Pois só se discute a relação quando alguma coisa não vai bem e ele não estava a fim de passar mais momentos desagradáveis, prejudicando a relação.

Os blocos iam se sucedendo, as situações eram expostas, as respostas eram dadas ...

- Toalha molhada em cima da cama.

- Elas têm até razão, mas como todos, nós homens temos nossas manias e que essa já estava enraizada em nosso inconsciente. Seria mais fácil ela aceitar e em vez de perder tempo se estressando ao reclamar, colocasse a toalha no lugar. Ia ser menos traumatizante para a relação e menos desgastante para ela.

- Ela chega toda arrumada para a festa e ele não comenta.

- Nós nos aprontamos em dez minutos, geralmente é uma roupa pouco confortável, ficamos esperando horas, às vezes, suando em bicas e quando surgem ficam aguardando nosso comentário. Nosso comentário seria: Porra!! Fiquei aguardando enquanto você exercia sua insegurança na escolha do melhor modelito para a ocasião. “Será que a fulaninha vai estar mais bonita do que eu? Será que o vestido verde vai combinar com os olhos da noiva? E o sapato dourado vai combinar com o lustre do salão?” Etc. Sem falar da maquiagem. Blá blá blá! Mas não, em nome da relação, aceitamos essa mania enraizada no inconsciente delas e perguntamos apenas: Onde está a chave do carro.

- Falta de atenção quando ela fala.

- Elas pronunciam mais de dez mil palavras por dia enquanto que nós, apenas quatro mil. É muita coisa para nós ouvirmos. Com certeza alguma coisa é desnecessária.

Em resposta a certa situação, brilhantemente um deles desferiu:

- Elas adoram reclamar de nossas manias, de nossos defeitos. Não são capazes de relevar alguma coisa, mas se esquecem dos fios de cabelo na pia e chão do banheiro, dos grampos espalhados pela casa, do tubo de pasta de dentes todo amassado ou sem tampa, do estojo de maquiagem espalhado entre o quarto e banheiro, dos xampus deixados abertos, das calcinhas penduradas no box e da tampa do vazo que temem em deixar abaixada.

E as sugestões e conselhos eram sendo apresentados. Algumas vezes Lua ilustrava com passagens de sua vida particular ratificando o quanto era perfeita.

Dado momento tive que levantar, tomar banho e sair.

Já no caminho de casa comecei a lembrar de certa situação vivida há muito tempo.

Ainda empresário no ramo da construção civil. Dezembro, época de vacas magras. Meu ex-sócio é um cara muito bem relacionado e um belo dia daquele verão escaldante surge com um amigo que queria fazer uma pequena reforma no apartamento de sua namorada, onde iriam morar.

Após algumas discussões, para acertar os detalhes construtivos e, claro, reduzir o custo e justamente por isso, repassamos a obra para nosso engenheiro que na época estava um pouco ocioso. Nos comprometemos a acompanhar o andamento dos serviços além de disponibilizar a estrutura da empresa em troca do salário desse engenheiro que, por sua vez, iria “tocar” a obra, administrar os custos de material e mão de obra e fazer as prestações de contas sem taxa de administração. Negócio de mãe.

A obra que a princípio tratava-se de uma pequena reforma que, por deslumbramento da proprietária teve seu escopo aumentado em muito, consequentemente seu custo e prazo.

Enquanto isso, ela que havia se tornado badaladíssima ao despontar em uma das novelas das oito ficou sozinha mas não deixou de estar à frente das obras.

O engenheiro, um sujeito educado que depois de dois anos trabalhando conosco se mostrara um cara honesto e capaz nas suas atribuições. Mas, apesar da vasta experiência, não registrava as modificações e acréscimos solicitados e ia executando as obras de acordo com as necessidades da moçoila. Depois fomos saber que estava confiando na amizade dela com meu ex-sócio, mas a amizade era com o ex-namorado.

E assim foi até um dado momento em que ela caiu das nuvens ao ver a drástica redução de seu lastro financeiro.

Não podia ser diferente, deu chilique e disse que não ia pagar. Aquela baixarias que muitos daqueles que subiram rápido fazem. Você conhecem.

Discute aqui, discute ali e acolá, enquanto isso, decidiu-se que o engenheiro ia sair de cena e nós acabaríamos a obra, mas sem nenhum acréscimo. E assim o fizemos, pela amizade que não existia. Ela bancou essa finalização, apenas o custo, e continuou a pendenga com o engenheiro.

Após várias Discussões o acordo. Sob a consultoria de um “espertogado” ela quitou com os fornecedores e exigiu do engenheiro um recibo de cada um dos peões com firma reconhecida para quitar a mão de obra.

Ele correu atrás, de carro, levou cada peão ao Cartório, pagou a abertura de Firma de cada um deles, fez os recibos de quitação, reconheceu a firma em todos e, (pasmem!!!) entregou a ela sem receber o dinheiro correspondente. Ela disse que iria pagar em alguns dias.

Os peões não poderiam ficar sem pagamento e para evitar uma tragédia quitamos a dívida deles.

Fechamos a empresa em meados de 2000 e ele já não trabalhava mais conosco.

Até onde sei a dívida permanece.

Lua esqueceu de ilustrar o programa com essa bela passagem de sua vida.

Passaram-se alguns meses e, pasmem, lá estava ela novamente. Dessa vez me deixando estupefato.

Época de eleições, período de fartura. Sim, fartura de beijinhos, abraços, passeatas, carreatas, cartazes espalhados pelas ruas das cidades numa poluição visual absurda. Época que ouvimos as mesmas ladainhas, as mesmas promessas que com certeza jamais serão cumpridas.

Sim, lá estava Lua, com um discurso politicamente correto, em vários anúncios institucionais. Ora explicando como votar, ora mostrando a importância do voto para o futuro do país e outras “cositas” mais.

Discursava como a representante da honradez, da honestidade e caráter. Suas palavras, cuidadosamente escolhidas, formavam um texto simples porém claro, direto e extremamente verdadeiro.

Cada vez que ela invadia minha sala de estar trazia junto de si um sentimento de vergonha, decepção e tristeza.

Mas o pior deles era a certeza de que nunca nos tornaremos um povo sério, digno de respeito e credibilidade perante os demais residentes desse planeta maravilhoso.

Uma pena.

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