Caros escassos e inteligentes leitores,
mais uma. Sim, mesmo com os problemas que assolam e muito, nosso país e muito
mais por conta deles, é necessário algo que nos tire, mesmo que por alguns dias
seguidos, das agruras da vida e desses absurdos que nos afligem.
Viajar, para a grande maioria, é uma
delas e não é diferente para mim então, vamos nessa.
Sendo assim, aliado aos motivos do porquê
coloco as rodas nas estradas; pilotar em rodovias de boa qualidade, com muitas
curvas, inseridas em visual agradável e com tempo bom (lembrem-se que tempo bom
significa céu nublado, temperatura baixa, sem chuvas e principalmente sem
transtornos durante o trajeto); inicio mais um texto.
Dessa vez começo este após finalizado o
roteiro, pois, como quase sempre, minhas viagens tem em seu primeiro dia o
mesmo trajeto. Isso permite antecipar algumas linhas.
Tinha em mente fazer essa viagem em
julho e com destino ao nordeste a fim de visitar parentes queridos. Estou
devendo isso faz anos e como não voo, voava quando tinha medo, hoje tenho pavor;
então, só resta a moto.
Cheguei a elaborar um roteiro, mas a extrema
insegurança da região me fez pensar duas vezes. Não há como atravessar a Bahia
atualmente sem ser em bando e bando não é seguro e são muitos a discutir caso
seja necessário alguma modificação de roteiro, o que não tem sido raro em
minhas viagens. Já ouvi alguns relatos de perrengues passados por alguns
motociclistas que se aventuraram por lá nos últimos anos e eu não tenho
paciência, dinheiro nem estômago para viver tais situações então, atualmente o Brasil se restringe as regiões sul, sudeste e centro-oeste. Como o
centro-oeste carece de montanhas e serras, mesmo com seus muitos atrativos, não
me apetece rodar em duas rodas por tais belezas. Sendo assim, sobram as regiões
sul e sudeste e para mim está muito bom. Há muita coisa boa para ver e viver
por lá.
Também já disse antes que fazer aquelas
viagens de poucos dias e muitos quilômetros com destino ao sul da Argentina ou norte
do chile não são meu foco. Atacama, Los Caracoles, Ushuaia, Machu Picchu etc.
são lugares que gostaria de conhecer, mas chegar até lá é necessário percorrer infindáveis
retas e isso é desanimador. Além disso, também tenho ouvido poucas e boas de
quem rodou pela Argentina nesses últimos anos e imagino que mesmo agora com um
governo descente ainda seja complicado andar por esses lugares. Quem sabe na
próxima, afinal parece que o mundo está caindo na real e enxergando as verdades
de narrativas a décadas contadas por uma mídia vendida e desonesta. Então, rodo
satisfeito pelas serras e estradas do sul/sudeste do Brasil. Assim mesmo, ainda
percorro algumas enjoativas retas. E nessa viagem não vai ser diferente ainda
mais se formos percorrer o litoral do Uruguai como está previsto pois, para
chegar lá teremos de percorrer os belos, porém enjoativos pampas gaúchos e
uruguaios.
Ainda preciso tomar algumas providências:
trocar os pneus é uma delas. Os que estão na moto ainda rodam uns bons 3.000 km
portanto, estou pensando em fazer essa troca no meio da viagem.
Londrina, onde hoje Mora Claudio, que
esteve comigo em minha terceira viagem, é a primeira opção. De bom o fato de
ele com certeza conhecer um lugar confiável para esta troca e onde eu poderia
mandar entregar os pneus que comprarei pela internet. De ruim é que serão
apenas mais 1.200 km a rodar. A segunda opção, 2.400 km, seria Uruguaiana que
não conheço, portanto, não sei onde mandar entregar os pneus e muito menos um
lugar confiável para a troca.
Outra providência é fazer a revisão.
Gosto de iniciar as viagens com ela “zerada” com todos os óleos, demais líquidos,
velas, filtros, etc. em dia. Costumo fazer isso com no mínimo 15 dias da viagem
para dar tempo se surgir algum imprevisto pós revisão.
O início desta foi reagendado para
01/10/24, mas até lá, dependendo do andar da carruagem pode haver adiamentos.
Estar aposentado permite essas coisas.
Mais uma vez não será uma viagem solo,
Reinaldo estará comigo desfrutando das estradas e serras da região pela segunda
vez nessa nossa terceira viagem.
O roteiro prevê mais de 6.900 km com
destino a Montevideo contornando todo o litoral do Uruguai, incluindo a volta. Será
a maior delas até agora e no primeiro dia iremos sair do Rio de Janeiro para pernoitar
em Pirassununga, SP. Serão 541 km dos quais até Pouso Alegre, MG. 410 km serão
estradas já percorridas em outras ocasiões e que até dois anos atrás estavam em
bom estado. São poucas retas, muitas curvas e duas serras que permitem uma perfeita
readaptação ao equipamento já que têm sido raríssimos os bate-voltas de fins de
semana que tenho feito nesses últimos anos. Pouco tenho andado em minha moto de
viagem a não ser curtos tiros pela cidade para mantê-la em movimento e
principalmente a bateria carregada. Mesmo assim, em 29/02/24 tive de instalar
uma nova. A anterior durou uns três anos, tempo mais que suficiente para a
duração desse item. Está bom demais.
Sim, estou iniciando esse texto em 01/03/24
e acabei de fechar o roteiro. Como veem, com bastante antecedência. Mais uma
das vantagens de estar aposentado.
O GPS já sairá do Rio alimentado com
todas as coordenadas do roteiro. Elas serão divididas pelos dias da viagem que
previ serem 15.
Repito esse início com frequência pela qualidade
das estradas, suas curvas e o fato de serem conhecidas, o que permite errar
menos e se houver erros de pilotagem e/ou readaptação, facilita “consertá-los”.
Hoje, 10/10/24 ainda estamos no Rio. O
novo adiamento se deve a acontecimentos de cunho particular que surgiram
inesperadamente. Sendo assim, a data de início será 18/10/24.
Devido esse novo adiamento, pensei em
desistir. A temperatura está aumentando com a proximidade do verão e isso não
me agrada em nada. Mas conversamos e acordamos que vamos mesmo sair dia 18 e
seguir até onde nossos humores permitirem.
O bom é que a distância temporal gerada
pelo adiamento permite mais melhorias nas condições das estradas afetadas pela
recente tragédia ocorrida no Rio Grande do Sul; ainda mais porque percorreremos
as serras deste estado apenas na volta.
As motos já estão devidamente revisadas
com seus pneus trocados e “lixados”, mas surgiu um pequeno problema, na troca
dos pneus foi diagnosticado que as pastilhas do freio dianteiro foram pro saco
e eles não tinham em estoque estou aguardando a chegada, mas já estou vendo
outras duas opções para obtê-las. Resolvido isso, só falta fazer a “mala” e
partir.
Já estou começando a sentir aquela agradável
ansiosidade pré-viagem
Mas chega de enrolação e vamos nessa...
prever o futuro.
Encontro no posto BR do Humaitá, dia 18
de outubro de 2024, com motos abastecidas e GPS ligado na rota 01, serão viradas
as chaves. Tripi 01 e Trip 02 serão zerados, as primeiras marchas engatadas, os
aceleradores acionados, soltaremos as embreagens e daremos início, às 05:30 h
aproximadamente, a mais uma aventura.
Destino: já disse, Uruguai. Objetivo:
percorrer algumas das inúmeras serras do sul e sudeste e conhecer alguns
atrativos naturais ou culturais pelo caminho.
Céu nublado, temperatura amena, é tudo que
se espera. A primeira parcial será em diagonal à oeste a fim de ao final do
quinto dia pernoitarmos em Barra Quari, a 1 km da fronteira sudoeste com o
Uruguai.
Cumpriremos o roteiro planejado para
esta parcial. Dutra (BR-116) até um pouco depois de Itatiaia e acessando a
BR-354 com destino à São Lourenço - MG. Só aí serão duas serras (Araras e a de
acesso a São Lourenço) que juntas servirão para nossa readaptação as motos em
estradas.
Antes, no Graal de Resende, RJ. Faremos
um pequeno lanche e reabasteceremos as motos pela primeira vez.
A fim de não perder tempo costumamos
fazer o máximo possível na mesma parada, abastecer, banheiro e alimentação, não
será diferente nessa.
Em São Lourenço, reabasteceremos pela segunda
vez, almoçaremos e partiremos para Pouso Alegre passando por Santa Bárbara do
Sapucaí. Novo lanche e reabastecimento.
Daí, sairemos com destino a
Pirassununga, passando por Poços de Caldas...
Pronto, agora é aguardar nosso retorno
para os demais relatos da viagem.
Até lá.
E assim foi...
A VIAGEM
Como chegamos cedo em São Lourenço,
adiamos o almoço e ao parar para abastecer, conhecemos um casal de motociclistas
muito simpático. Estavam de carro e sugeriram que almoçássemos em Lambari.
Seguimos em frente atrás deles.Almoçamos no Paladar Mineiro, um
quilo honesto e muito barato – R$ 20,16. Comida simples, porém, gostosa.
Estávamos em Minas, como ser diferente. O papo foi excelente, conversamos
animadamente sobre a região, um pouco de sua história e da atual situação precária
do país.
Seguimos viagem por estradas até então desconhecidas,
muito bem pavimentadas e excelentes curvas. A readaptação às motos tinha sido
atingida com sucesso nas duas serras anteriores. Estávamos rodando com
tranquilidade, sem erros e muito prazer. O clima estava ameno e o céu nublado,
condições ideais para o que estávamos fazendo. Os novíssimos pneus Michelin
Road 6 estavam tendo performance sublime, proporcionando segurança mais do que
o esperado, antecipando ousadias previstas para dias mais à frente.
Isso tudo trazia para mim sentimentos há
muito vividos e pouco previstos para essa viagem devido a já citada proximidade
com o verão.
Hoje posso dizer que foi um dos melhores
dias dessa viagem, no que se refere a pilotagem. Momentos de intensidade única.
Estrada vazia, curvas de raio curto, asfalto liso e recém pavimentado e pneus
novos com performance surpreendente.
Não seria exagero dizer que meu desempenho
foi um dos melhores entre tantos outros vividos em todas as minhas viagens.
Estava surpreso com a simbiose readquirida em tão pouco tempo, lembrem-se, estávamos
no primeiro dia e tudo isso me fazia acreditar que essa seria uma grande viagem.
Isso fez diminuir a prévia de desconfiança na qualidade desta.
Paramos próximo a São Sebastião da
Bela Vista, MG, para abastecer, beber uma água e breve descanso; eram duas
e pouco da tarde. Trocamos informações com frequentadores do posto e seguimos.
Estava tudo indo muito bem, as curvas
em asfalto de primeiríssima se acumulavam prazerosamente.
O previsto seria dormir em Pirassununga,
mas faltando uns 50 km para chegarmos em Poços de Caldas a chuva começou
a cair. Ela veio forte solicitando que parássemos para vestir os impermeáveis.
Porém a estrada não oferecia lugar seguro e coberto para essa tarefa, até
aparecer um posto meia boca onde paramos e fomos informados que Poços de Caldas
não estava longe e como já estávamos iguais a dois gatos escaldados, não havia
motivo para perder tempo vestindo os impermeáveis.
Ainda chovia quando chegamos na cidade
e após três hotéis lotados encontramos um que se mostrou bem ruinzinho – Hotel Guarany.
Para vocês entenderem, em um determinado momento a simpática atendente estava fazendo
chapinha enquanto nos atendia informando que os quartos não tinham ar
condicionado.
Levamos as bagagens para nossos quartos
e voltamos para levar as motos ao estacionamento distante uns 500 metros.
Quando voltamos ao hotel a chuva ainda mantinha nossos corpos molhados e nossos
humores em declínio.
Ao entrar no box, descobri que o
chuveiro elétrico, apesar de boa pressão, não funcionava e o banho foi nessa
temperatura mesmo porque não ia me vestir para fazer a reclamação, esperar uma possível
troca de quarto ou conserto do chuveiro. Eu estava cansado, molhado e com fome
em demasia para acumular mais um problema, uma das vantagens de estar só, decidir
sem discutir. Tudo compatível com o valor do pernoite; R$ 80,00.
Jantamos uma boa pizza na Cantina do Araújo.
Espaço amplo e agradável com atendimento de primeira, feito pelo simpático garçom.
E fomos dormir.
Após um café da manhã maroto, buscamos
as motos, acomodamos a bagagem e seguimos até os arredores de Pirassununga onde
paramos para um pequeno lanche. Seguimos até Santa Rita do Passa Quatro, SP,
onde abastecemos. Passamos pelos arredores de Bauru, reabastecemos, arredores
de Ourinhos, e chegamos em Cambará, já no Paraná.
O número de retas aumentou nesse
trajeto, mas as curvas ainda eram em quantidade satisfatória provendo prazer
suficiente, mantendo o astral em alta. Ainda eram estradas novas, de boa qualidade
e o tempo, apesar do chuvisco no início do dia, se firmava agradavelmente
nublado com temperatura amena.
Em Cambará abastecemos e nos indicaram
o Hotel Bourbon.
O hotel, de excelente qualidade fazia jus
aos R$ 249,00 mais R$ 101,00 de despesas, pagos na manhã seguinte. O delicioso jantar
oferecido arrematava o conforto do quarto.
Em contraste com o anterior, dessa vez o
café da manhã foi digno e revigorante.
Partimos cedo, em direção a Londrina
onde estava previsto encontrar e almoçar com Cláudio, parceiro da minha 3ª
viagem, hoje residente nessa cidade.
As estradas permaneciam de boa
qualidade e as curvas voltaram em maior quantidade. A chuva caía em volume razoável
e o comportamento dos pneus nesse ambiente se mostrou notável. A velocidade,
apesar de menor do que nas viagens anteriores ainda oferecia muito prazer e o
objetivo de pilotar em estradas sinuosas estava sendo cumprido à risca e sem
riscos.
Estávamos bem e a chuva já havia sido
deixada para trás quando Reinaldo sinalizou para pararmos. Ele já havia citado
sua preocupação com o nível do líquido de arrefecimento de sua moto e após nova
verificação sua preocupação aumentou. O reservatório auxiliar de expansão
estava vazio, o normal é estar entre as marcações de limites inferior e
superior do mesmo. Sem opção, decidimos seguir e parar na concessionária em
Londrina.
Em resumo, Reinaldo teve um problema
com o radiador dessa moto – BMW GS 850 -há um ano atrás. Tecnicamente o
problema havia sido resolvido, mas houve uma batalha jurídica em paralelo, pois
esse problema tem acontecido com frequência nas motos desse modelo. Existem
vários vídeos na internet sobre isso e a BMW ainda não abriu o recall para solucionar;
apesar de algumas concessionárias já fazerem a troca gratuitamente. A substituição
foi feita, porém, ele teve de arcar com os custos. Acionou a justiça e venceu a causa sendo
restituído integralmente.
Enquanto ele era atendido, contatei
Cláudio que nos encontrou na concessionária menos de uma hora depois.
Humberto, o chefe dos mecânicos,
bastante atencioso, como todos os demais com quem tratamos, mostrou que o
reservatório estava cheio, além do limite superior por isso parecia vazio para
um leigo. Esclareceu o funcionamento do sistema, fez os procedimentos e testes que
julgou necessários e entregou a moto.
Permanecemos mais um bom tempo na concessionária
conversando com Cláudio. Grande figura que hoje abandonou as estradas. Pilota
uma Triumph Bonneville e pega estrada apenas para ir a Curitiba visitar
familiares. O papo foi excelente onde colocamos em dia histórias de nossas
vidas desse tempo em que não nos víamos, desde nossa viagem...
Saímos da concessionária, abastecemos e
seguimos em direção a Campo Mourão onde estava previsto nosso 2º pernoite. Havíamos
perdido um dia com chuvas e essa parada, porém, dormir em Campo Mourão nos
colocaria dentro das rotas diárias previstas inicialmente.
Almoçamos em Maringá na Lanchonete
Paraiso e seguimos para Campo onde pernoitamos no Santa Maria Business Hotel. De
boa qualidade, mas um pouco caro para o que oferece; R$ 245,00 o pernoite.
A cidade é tranquila. Como era uma 2ª
feira, estava vazia e quase tudo fechado. Encontramos o Casarão Petiscaria.
Simpático e agradável. Comemos bem, mas nada de extraordinário, porém, a cerveja
estava ótima, geladíssima.
E foi aí que, conversando, descobri que
não havia levado o passaporte para entrar no Uruguai. É sabido que para
atravessar a fronteira é necessário o passaporte ou uma carteira de identidade
atualizada; não serve a carteira de habilitação, como alguns pensam. A CNH só
serve como identidade aqui no Brasil. Mais um problema.
A Carta Verde, outro documento necessário,
iríamos adquirir em Uruguaiana, RS.
Mudando o roteiro, decidimos seguir até
Pato Branco e de lá voltar para leste em direção a Serra do Rio do Rastro e
depois as serras gaúchas. De bom seria passar pelas Serras Catarinenses o que
não estava previsto no roteiro inicial.
Verificamos também que os preços no
Uruguai estão proibitivos então, com a gasolina custando R$10,00 o litro; a mudança
não seria tão ruim assim. Com isso, deixaríamos de percorrer os pampas gaúchos e
uruguaios providos de detestáveis retas e mais retas. Ponto para a mudança.
Voltamos para o hotel, dormimos e após
um bom café da manhã, ao chegar no estacionamento do hotel para colocar as
bagagens nas motos, me deparei com a seguinte imagem...
Ao ver me aproximando, nosso amiguinho voou
para uma viga do telhado e lá ficou nos observando completar os procedimentos
logísticos. Seguimos viagem.
Partimos rumo a Pato Branco
conforme decidido. E 129 km depois, pegamos à direita em uma bifurcação para
acessar uma estrada que, na época da elaboração do roteiro, pareceu ser
bastante sinuosa. Restava saber o estado da pavimentação.
Não nos decepcionamos, a estrada era
maravilhosa. Recém pavimentada, curvas em profusão, quase sem retas, pouco
movimentada, tempo meio nublado e temperatura agradabilíssima. O que queríamos
mais?
Bailamos em êxtase por excelentes mais
de 120 km onde a simbiose entre homem, máquina, pneus e asfalto, em alguns
momentos, aproximou-se ao limite do risco.
E assim foi até chegarmos em Laranjeiras
do Sul onde abastecemos e fizemos um breve descanso, hidratação e um bom
papo com os frequentadores do posto que falaram da recente pavimentação desse e
de outros trechos que o estado do Paraná fez e está fazendo em suas estradas.
E qual não foi nossa surpresa ao
verificar que ainda havia mais prazer a desfrutar. Após mais 60 km, nos arredores
de Saudade do Iguaçu cruzamos o Rio Iguaçu. Paramos na ponte para
apreciar o entorno...
A estrada até Pato Branco, onde
almoçamos, permanecia igual tanto no que se refere a sinuosidade como qualidade
e o tempo seguia como antes, foi um dia glorioso até chegarmos nessa cidade.
Após o almoço, seguimos a fim de
pernoitar em Caçador, já em Santa Catarina. Seria uma rota não prevista
no roteiro inicial e a ausência de um computador dificultou a elaboração do
novo.
Pernoitar em Caçador fez parte da minha
primeira viagem. Não aconteceu nada de diferente quando estive lá, mas essa
passagem me deixou algumas boas lembranças que me pedem revê-las sempre que
elaboro novo roteiro pelo sul.
Porém, a ideia de dormir em Caçador não
durou muito. Próximo de Palmas a pista a nossa frente estava com tráfego
literalmente parado. Seguimos pela esquerda, em velocidade reduzida, evitando
os que vinham na direção contrária, ultrapassando os carros, ônibus e caminhões
parados até chegar à frente de todos; a vantagem de viajar de moto. Estavam trocando
a pavimentação para concreto. Muita areia e confusão.
Descemos das motos e fomos conversar
com o rapaz que controla o trafego. A duração da parada seria de mais de uma
hora e após nossa chegada seria quase uma hora de espera. Além do rapaz, já
estava lá um professor de história falador de papo agradável. Estava em uma
Honda 250 seu meio de transporte até para viagens. Contou boas histórias. Minutos
depois chegou outro que é motorista de uma empresa fornecedora da obra. Também com
excelente humor. Ficamos os quatro conversando enquanto o primeiro fazia seu
trabalho. Apesar do calor, o sol já dava o ar de sua graça, a conversa fez o
tempo voar. Nos despedimos e cada um seguiu seu caminho.
Em certo momento da conversa o
motorista disse que se fossemos para Caçador iríamos encontrar outra parada
igual àquela, conversamos e resolvemos pernoitar em Palmas.
Poucos quilômetros depois chegamos à cidade.
Paramos em uma loja em uma esquina para nos informar sobre hotéis. O
proprietário, muito atencioso, ofereceu água e café.
E nos mostrou sua BMW GS 1200 Edição
Especial, comemorando os então 5 anos da inauguração da linha de montagem em Manaus,
que eu não conhecia. Linda, conservada e pouco rodada.
Conversamos bons minutos e após a
indicação do hotel, partimos com esse destino no Wase.
O Hotel De Fratelli – R$ 150,00 - fica
quase na saída oposta da cidade. Agradável, boas instalações onde, após o
banho, jantamos. A comida honesta foi o suficiente para atender as necessidades
do momento.
Após check-in, malas no quarto e um bom
banho, desci e Reinaldo já me aguardava para o jantar. Comemos no hotel, um variado
bufe sem restrições de quilo bastante saboroso. Depois, saímos, fumamos um “cigarrimdipaia”
e nos deparamos com o seguinte...
E subimos para nossos quartos para dormir.
No dia seguinte, após um bom café da
manhã, fechamos a conta e fomos levar a bagagem para as motos. A garagem estava
mais iluminada e nos deparamos com essa maravilha...
Um antigo caminhão Mercedes Benz L 312 em
excelente estado que estava na garagem e não tínhamos visto quando chegamos na
noite anterior.
Bagagens nas motos e seguimos em direção
a São Joaquim, SC. Após 104 km paramos em um posto em Água Doce, onde fizemos
um lanche rápido e abastecemos as motos. Mais 157 km, paramos em São José do
Cerrito e novo abastecimento. O tanque da moto de Reinaldo é menor do que o
da minha por isso tantas paradas para abastecimento.
A estrada percorrida nessa manhã estava
em ótimo estado, mas chovia um pouco e a lama deixada pelos caminhões que a acessavam,
oriundos das fazendas e sítios do entorno, prejudicaram um pouco o desenrolar
do início dessa perna da viagem. Estávamos nas Serras Catarinenses e em
dado momento, quando a sujeira ficou para trás, conseguimos retomar velocidades
esperadas. A sucessão de curvas e poucas retas em asfalto de qualidade percorridas
nessas velocidades confirmaram a excelente qualidade dos pneus recém instalados.
Em poucos dias já havíamos atingido a
confiança necessária nesses pneus e nossa pilotagem fluía na simbiose do “tetravirato”
formado por homem, máquina, pneus e estradas. A chuva que lavava o caminho
acrescentava mais prazer devido a performance fantástica dos pneus. Nessas
condições eles se comportaram de forma primorosa, com aderência impar
proporcionando segurança estrema, permitindo ousadias nunca vividas, ao menos
por mim, em piso molhado. Nós estávamos em êxtase mais uma vez.
Obrigado Senhor!
Quero deixar aqui registrados meus elogios
à Michelin pela evolução constante de seus produtos principalmente no que se
refere a pneus para motocicletas. Desde que comecei a rodar em estradas sobre
duas rodas utilizei algumas versões desse produto, desde o Anakee 3; já se passaram
mais de 15 anos nessa brincadeira. Além disso, tenho certo conhecimento com
alguns funcionários e sei da preocupação desta empresa em estar sempre à frente
das demais. Posso estar errado afinal, não sou nenhum expert, mas não vejo nos
concorrentes produtos similares.
Estávamos em Lages, na frente do
Vidal Restaurante onde almoçamos.
O atendimento foi ótimo, comida
excelente cuja carne estava macia e suculenta. A tradicional salada de batatas
junto com a deliciosa polenta frita arremataram o prato. Repeti, bebi um café e
fomos para a varanda fumar um “cigarrimdipaia” e apreciar a constância da garoa.
Faltavam 71 km para São Joaquim, local previsto
para o próximo pernoite.
A estrada, já conhecida, não deixa nada
a desejar em relação as anteriores o que completou o excelente dia agora meio
ensolarado.
Na solidão do excelente capacete LS2 adquirido
há poucos meses na KPA7, loja especializada no Città América, na Barra da Tijuca,
no Rio, cujo dono, Fernando, bastante atencioso, conhecedor do assunto e de excelente
papo, atende muito bem. Indico sem receios.
Lembrando: para a minha antepenúltima
viagem havia comprado, em outra loja, um Norisk que me incomodou por toda a
viagem. Na penúltima voltei a usar meu Schubert que havia comprado para minha
segunda viagem e quebrou na última em uma ida à Brasília para um compromisso profissional.
E agora no LS2 eu ouvia o baixo zunir
do vento que emoldurava meus pensamentos entremeados pela voz familiar do GPS
avisando dos radares e lombadas.
Até então foram cinco dias de
aprimoramento da simbiose em estradas, na maioria desconhecidas, porém, prazerosíssimas.
Estava feliz com a parte do roteiro previamente escolhido e também da parte
modificada que, tirando os pequenos problemas, faziam dessas escolhas 100% aprováveis
por qualquer motociclista.
Em São Joaquim paramos em um
posto para abastecer e obter informações sobre hotel. Conhecemos Eder,
motociclista que estava trocando o óleo do carro. Conversamos bons longos minutos.
Ele ligou para um amigo cujo hotel já estava lotado, sugeriu outro que também
estava lotado. O terceiro, bem no centro, tinha vaga – R$ 140,00.
O dono, bastante atencioso nos recebeu
muito bem. Informou não haver ar condicionado nos quartos porque em São Joaquim
isso é desnecessário devido ao clima frio durante quase todo ano. Subimos,
banho, um descanso rápido e saímos para procurar um lugar para jantar.
A bela cidade tinha suas ruas limpas e vazias,
provavelmente devido a garoa que voltou a cair. Passamos pela tradicional praça,
por um restaurante que ainda estava fechado e chegamos a uma pizzaria que iniciava
o movimento da noite.
Era cedo, entramos, pedi uma cerveja e
disse que não estávamos com pressa e iríamos esperar aumentar o movimento (o
forno aquecer) para fazer o pedido. Sentamos e comecei a reparar na decoração
do espaço. Rustica e aconchegante.
Qual não foi nossa surpresa ao ver Eder
adentrar ao recinto. Ele é o proprietário da Plátano Pizzaria.
Sem que percebêssemos mandou trazer como
cortesia uns pequenos cubos de pães caseiros e torrados para serem mergulhados
em um molho delicioso. Nada sobrou enquanto conversávamos sobre a vida.
Momentos depois pediu licença e foi tratar de suas tarefas, mas não deixou de
passar de volta alguma vezes enquanto degustávamos a deliciosa e surpreendente levíssima
pizza que escolhemos.
Era uma 4ª feira chuvosa, mas o
movimento na pizzaria estava muito bom. Em um canto especialmente destinado a
crianças, às 4ªs feiras, o pizzaiolo as ensina a fazer pequenas pizzas e degusta-las.
Elas estavam se divertindo muito, os pais consumindo e babando por cada
movimento de seus filhotes mestres cucas. Tudo isso sob um valor simbólico de
R$ 35,00, fora o consumo dos pais embebecidos. Jogada de mestre.
Voltamos debaixo da insistente garoa, para
o hotel, satisfeitos e cansados.
Ao adentrar no recinto do café da
manhã, vi uma mesa com frutas, sucos, pães e algumas guloseimas tradicionais da
região que a simpática responsável (esposa do dono) explicou cada um deles com
orgulho de seus feitos culinários. Como vinha fazendo diariamente, iniciei com
mamão e melão, depois ovos mexidos, pão com manteiga, presunto e queijo, suco e
finalizei com um copo de iogurte de morango com granola. Excelente. Claro que
nesse caso acrescentei uma das guloseimas apresentadas, uma delícia.
Seguimos em direção a Serra do Rio
do Rastro que Reinaldo conhecia, mas ainda não havia percorrido em nossa
primeira viagem porque estava fechada devido a obras nas encostas.
Estradas também já conhecidas e agora
recapeadas acompanharam a sinuosidade e qualidade das anteriores, foram quase 50
km mantendo nosso astral em nível elevadíssimo. No caminho paramos na Churrascaria da
Cascata, que conheci em minha primeira viagem e sempre que vou ao sul passo
por lá. O dono, também motociclista de longas viagens, nos recebeu muito bem,
como sempre. Era cedo e eles estavam iniciando as atividades do dia. Bebemos
café, água e conversamos quase uma hora. Jaime, recém pai de gêmeos estava
radiante com seu feito.
Ao voltar para as motos reparei que a
coifa da ponta do cardã estava solta. Fizemos um gatilho com esparadrapo e como
fiquei preocupado com a possibilidade de ter entrado lama nas engrenagens,
resolvi passar em uma concessionária para verificar e resolver o problema. Criciúma,
fica no caminho e é a mais próxima.
Como eu na 1ª vez, Reinaldo estava
maravilhado com as curvas da Serra do Rio do Rastro, era sua primeira vez. Para
mim era a 4ª e apesar da beleza do entorno acho as curvas muito fechadas que
aliadas a humidade da região e da pista me dão certo receio, ainda mais
descendo. Dessa vez fui devagar apreciando o visual.
Paramos em Lauro Muller para
reabastecer, um lanche e verificar o endereço da concessionária em Criciúma.
A esposa de Jaime havia trabalhado lá antes de ter os bebes e ele falou para
citá-los pois assim iríamos ser muito bem atendidos.
Em Criciúma, demoramos um pouco para
chegar na concessionária. Fomos muito bem atendidos e a moto logo foi para o elevador
para os procedimentos. Acompanhamos tudo de perto e o mecânico respondia a
todas as nossas dúvidas com paciência. Executou o serviço com maestria e presteza.
Em dado momento informou que ali, no
atendimento ao recall para troca do eixo cardã é praxe a troca das coifas em
motos acima de 60.000 km. A minha estava com aproximadamente 78.000 na época do
atendimento ao recall e aqui no Rio não fizeram essa troca e eu fiquei com o
problema.
Citei Jaime e sua esposa apenas ao
pedir para fecharem a conta e com isso recebi um desconto, paguei R$ 900,00. Tudo
pronto o mecânico ainda mandou fazer uma lavagem rápida antes de sairmos. Saí
de lá cogitando fazer minhas próximas revisões lá. O Atendimento é tão bom como
aqui no Rio, mas, depois de tantas viagens ao sul, adquiri a certeza de que os
serviços, de qualquer área, de uma maneira geral, são mais bem feitos nessa
região; deve ser assim para motos também.
Quando íamos seguir viagem caiu um toró
dos grandes, aguardamos até diminuir e saímos sob chuva com destino ao próximo
pernoite, Torres, já no litoral do Rio Grande do Sul.
Quase 100 km na monótona, cheia de
pedágios e lotada de radares BR-101 depois, chegamos a cidade. O hotel escolhido
fica a dois quarteirões da praia e depois de feito o check-in, ainda com as
roupas da viagem dei um pequeno rolê pela avenida litorânea a fim de verificar
as mudanças realizadas desde a única vez que estive no local. Prédios altos e em
profusão destoam com o que vi há mais de 40 anos atrás, previsível, mas surreal.
Um banho e descemos para o jantar. Fiz
contato por Whats App com Jeff, motociclista, membro dos Flecha de Prata, grande
amigo e parceiro de vários bate e voltas entre Rio e São Paulo, que recém havia
estado em Torres e indicou um restaurante de frutos do mar não muito próximo.
Reinaldo estava cansado então fomos a uma hamburgueria do outro lado da rua do
hotel. Excelente atendimento e para mim divino hamburguer. Gosto muito desse
tipo de comida. Depois, voltamos para o hotel.
Com garagem, quarto espaçoso, aconchegante,
confortável, com ar condicionado e café da manhã farto, tudo por R$ 170,00.
Foi no salão do excelente café da manhã
que vi um quadro de Torres na época em que lá estive...
A diferença é gritante. Recordei bons
momentos lá vividos há quase 40 anos em férias de verão passadas no Rio Grande
do Sul.
Mais 45 km de tediosa BR-101 até entrarmos
à direita, na altura de Terra de Areia, em direção a Caxias do Sul.
Era nossa primeira vez subindo por esse lado das serras gaúchas. Nas outras
vezes eu saí da BR-116 passando por Vacaria. O novo caminho começou com
pequenas retas e curvas de raio longo até chegarmos ao pé das serras. Visual
interessante com a estrada relativamente cheia. Na subida as curvas se tornaram
mais frequentes e as retas bem menos. Subíamos com a desenvoltura adquirida e
desenvolvíamos uma boa velocidade. Reparei que, diferente da nossa, na pista de
sentido contrário havia uma elevação longitudinal devido ao desgaste. Isso me
manteve alerta por todo o trajeto, pois poderia haver o mesmo à frente. Apesar da
preocupação seguíamos com segurança desfrutando o visual e as curvas. Até que
em certo momento, após uma curva fechada, do nada, estava em um túnel. A falta
iluminação e o susto aliado a sub-viseira escura que usava, me fez apertar com
parcimônia o freio dianteiro e um calafrio subiu pela espinha.
Detalhe: minha moto, como várias outras
big-trails possui um sistema eletrônico auxiliar de frenagem que balanceia a intensidade
da frenagem em 70% na dianteira e 30% na traseira. Isso faz com que seja
necessário frear apenas o dianteiro que o sistema faz o resto.
A preocupação era além dos carros a
frente, Reinaldo que vinha atrás, poderia reagir diferente e ...
Poucos quilômetros depois, mais um
túnel, nas mesmas condições. Passamos ilesos mais uma vez.
Mais uns poucos quilômetros e paramos
em um grande recuado à direita onde há um grande restaurante e algumas barracas
onde vendem guloseimas e bugigangas da região; delícias que o pouco espaço na
bagagem não permite trazer. Fizemos um lanche e fomos apreciar a linda vista do
mirante. O local estava relativamente cheio e conhecemos um motociclista da
região com uma Triunph Tiger 900 que vinha em sentido contrário. Da região, solícito,
que prefere fazer trajetos off-road. Informou que não havia mais túneis à frente
e passamos a trocar informações gerais sobre viagens enquanto desfrutávamos de
um “cigarrimdepaia” e do visual.
Nos despedimos e seguimos em frente.
Entre as serras as retas se tornaram mais frequentes e as curvas com seus raios
maiores. E assim foi até Caxias do Sul onde paramos em um posto para
contatar Fernando, outro membro dos Flecha de Prata e parceiro de bates e voltas
como Jeff.
Grande cara, gaúcho que morava no Rio e
mudou-se para Caxias sua cidade de origem. Eu e Reinaldo o conhecemos há alguns
bons anos no Postinho da Lagoa no dia em que tínhamos ido à Barra da Tijuca
pegar minha primeira GS 1200, ano 2008, que havia comprado de um colega da
empresa em que trabalhava. Paramos no posto e Fernando estava lá, com sua KTM 99
Adventure laranja, conversando com Luiz, outro membro dos Flexa, com sua BMW GS
1200, branca. Conversamos por um bom tempo e dias depois comecei a fazer bates
e voltas com o grupo por vários anos, conhecendo os demais membros do grupo.
Deixamos as motos na garagem de
Fernando e fomos almoçar em uma galeteria que ele frequenta. O papo estava
ótimo, com várias boas e hilárias recordações daquela época.
O atendimento de primeira nos
apresentou um sistema de rodízio tradicional da região que oferece uma
deliciosa sopa, uma excelente salada de folhas com pequenos pedaços de bacon, uma
salada de batatas dos deuses, polenta frita recheada com queijo da região ou sem
recheio, ambas torradas a perfeição portanto deliciosas e o galeto em pedaços
generosos que mais pareciam pedaços de frango.
A conversa sobre aqueles bons tempos aliada
a saborosa comida me trouxe fortes e emocionantes saudades.
Voltamos para pegar as motos e seguir viagem
em direção a Guaporé. Destino escolhido para o pernoite devido a
sinuosidade da estrada que o Maps mostrou na elaboração desta perna. Bento
Gonçalves e Garibaldi já eram conhecidas de outras viagens; resolvemos
apenas passar por fora.
A estrada, agora conhecida, permanecia
como nas outras vezes, asfalto de boa qualidade, curvas generosas e visual
deslumbrante. Dobramos à esquerda no acesso a Guaporé, pegamos uns 800
metros de paralelepípedo, depois mais uma sinuosa estrada, desta vez de
qualidade inferior, que em dado momento tinha a sua direita um rio de largura
considerável.
Reduzimos o peso da mão nos aceleradores
e passamos, estarrecidos, a observar o entorno. Às margens do rio via-se as
árvores caídas ou inclinadas na direção da correnteza do rio. Estávamos em uma
região bastante afetada pela recente enchente ocorrida entre abril e maio desse
ano. Das casas nas margens só se via o terreno, pedaços de fundações e piscinas
o resto, acima disso havia sumido. Não eram poucas as casas nessa situação que
aliadas a precariedade de trechos da estrada e as pedras que caíram da encosta
à esquerda formavam um cenário desolador.



Eu estava imaginando não só o prejuízo como
o número de vidas humanas ou não perdidas apenas naquele trecho de aproximadamente
60 km. Outros trechos dessa viagem que ainda iríamos passar encontram-se na
mesma situação. E pensar que o que está sendo feito para minimizar o ocorrido não
tem a participação do governo federal é desanimador. Fica aqui registrada a
resiliência do povo gaúcho que com a ajuda de empresas locais estão recuperando
o possível.
Durante nossa passagem pelo Rio Grande
do Sul, sempre que pertinente, falamos a consternação que nós cariocas de bem sentimos
e ainda sentimos pela situação em que os bravos gaúchos passaram e ainda passam;
citando as várias campanhas para angariar mantimentos e donativos que fizemos, para
enviar à região afetada. Eles agradeciam, alguns com os olhos marejados. Nosso
espanto era quando entrávamos em locais providos de televisão que estavam sintonizadas
naquele canal nefasto e desumano, a #GloboLixo, cujos jornalistas e atores
pouco ou nada fizeram para auxiliá-los.
E em determinado momento, vimos uma
pequena fila de carros e caminhões. Aguardavam a balsa para atravessar o rio
(uns 30 metros de largura) pois a pequena ponte havia sido levada pela
enchente.
Estávamos tristes e espantados com tanta
desgraça.
Chegamos em Guaporé cujos hotéis
estavam lotados, pois naquele fim de semana haveria uma corrida no autódromo de
Tarumã, próximo.
Ainda era cedo e resolvemos seguir até
a cidade mais próxima a fim de encontrar um hotel com vagas. Em poucos quilômetros
vimos um motel e pegamos dois quartos, R$ 70,00 cada. A vantagem, aprendida com
Jeff é, não só o preço como a proximidade da moto, do lado do quarto, assim
como a certeza de haver ar condicionado, banheiro limpo e cozinha funcionando
24 horas. Nesse caso não havia comida, a cozinha estava em obras e como o
acesso era de terra, pedras e em subida ficamos receosos de sair para jantar e
ter de voltar por ali. Ficamos com os poucos salgadinhos, chocolate, cerveja e
água do frigobar.
Fernando ligou e depois de saber que havíamos
chegado bem, passou para um amigo, outro motociclista conhecedor da atual situação
da região, que nos indicou o melhor trajeto para o dia seguinte irmos para Nova
Petrópolis, como planejado. Teríamos que voltar quase até Caxias do Sul
o que irritou Reinaldo que não queria voltar e sim seguir em frente. Mas foi
convencido pelo amigo que havia informado que nesse caminho haveria duas ou
três pontes caídas que obrigavam os veículos aguardarem até horas para
atravessar, já que as novas pontes provisórias permitiam a passagem de apenas
uma fila (ida ou volta) por vez e que isso iria tomar muitas horas de nossa
viagem.

Acordamos cedo para não ultrapassar o
limite da hora de estadia e sem café da manhã. Saímos com destino a Nova Petrópolis
sendo mais de 100 km em sentido contrário ao percorrido no dia anterior. O sol
dava o ar parcial de sua plenitude e a temperatura estava amena. Passamos pelos
arredores de Bento Gonçalves, Garibaldi, Carlos Barbosa, São Vedelino,
Feliz, Vila Cristina, e pegamos a BR-116 para o destino; percorrendo os 165
km previstos.
No meio disso, avistamos e paramos em
um belvedere abandonado cuja vista...
O plano era tomar café nos arredores de
Garibaldi e assim fizemos. Paramos em um grande posto, abastecemos, tomamos
um bom café da manhã e ao sair da loja de conveniência conhecemos dois motociclistas
que estavam indo trocar uma das Harley por um modelo 0 km recém comprada. Bom
papo e boas risadas depois, eles, assim como nós, partiram.
Estávamos do outro lado das serras gaúchas.
Boa pista, boas curvas, poucas retas e pouco movimento. Rodávamos redondo
aproveitando ao máximo o que aquele cenário nos oferecia. Adrenalina em nível
prazeroso e seguro.
Poucos quilômetros antes do destino
atravessamos o rio por uma ponte provisória instalada ao centro do caos
provocado pela inundação.
Seguimos em frente e chegamos em Nova
Petrópolis na hora do almoço. Achamos uma pousada com as duas ultimas vagas,
fizemos o check-in com previsão para duas noites. Na recepção havia um simpático
casal com quem trocamos algumas palavras e nos indicou onde almoçar. Subimos
para nossos quartos, um banho e vestindo roupas limpas, fomos almoçar onde
indicado. Estava cheio e o casal já estava na fila de espera. Conversávamos
animadamente quando foram chamados. Minutos depois chegou nossa vez. Sentamos à
mesa e quem estava ao nosso lado? O mesmo casal. Continuamos a conversa e à mesa
do outro lado sentou a mãe e sua filha. A mãe, uma senhora bastante simpática,
após saber que éramos motociclistas em viagem, contou de suas estripulias a
cerca de motocicletas. Fã ardorosa desse meio de transporte nos mostrou fotos e
vídeos de eventos motociclísticos que ainda hoje frequenta.
O amplo ambiente cheio e agradavelmente
barulhento. Na entrada um grande e variadíssimo bufe e ao lado uma área fumegante
de assados. A comida estava deliciosa, salada, carne, linguiça apimentada ou
não, salada de batatas etc. Claro que repeti. Depois, um belo e saboroso pudim
de leite e depois musse de chocolate. Não precisava mais nada.
Depois das despedidas de praxe, saímos
para dar uma volta na cidade...
Na saída do pequeno shopping havia mais
um motociclista e sua Harley. Conversávamos por bons minutos quando ele nos
indicou a Tenda do Umbu. Local tradicional de reunião de motociclistas, próximo
da cidade. Resolvemos dar uma passada antes de ir para Gramado no dia seguinte.
Voltamos para o Hotel para um descanso.
À noite saímos para jantar e passamos por um local destinado a grandes eventos.
O Natal na região começa cedo, outubro, e a cidade é tradicionalmente decorada...
Naquela noite o prefeito entregou a
chave da cidade ao Papai Noel...
Ficamos por ali, vendo o movimento e
conversando com algumas pessoas da região que, de alguma forma, participavam do
evento. Era uma pequena, mas bem movimentada feira com muitas barracas vendendo
artesanato, comidas típicas etc. Depois fomos a um restaurante alemão na
esperança de degustar algo tradicional dessa culinária, mas o menu só oferecia
pizza, alguns tipos de carne bovina e galináceas ou massa. Pedi um Carbonara e
Reinaldo um filé que segundo ele estava ótimo. Meu Carbonara tinha a massa
misturada com bacon e ovos mexidos, nada a ver com o tradicional prato
italiano, mas estava muito bom. Na volta passamos no local onde o prefeito
entregou a chave da cidade ao Papai Noel que, em contraste com o movimento da
cidade, ainda estava relativamente cheio.

Na manhã seguinte, um excelente café da
manhã. E seguimos para a Tenda do Umbu. Um grande posto de gasolina que fica a
aproximadamente 20 km de Nova Petrópolis, no sentido contrário de Gramado.
Tradicional local de reunião de motociclistas que fica lotado aos fins de semana
e feriados. Conhecemos dois novos amigos, Julian e Marquinhos e com eles ficamos
conversando por longos e bons momentos e apreciando as motos que iam e vinham.
Uma grande lanchonete oferece lanches e
pasteis diversos e um espaço destinado a comercialização de equipamentos para
motociclistas. Luvas, capacetes, botas, casacos, camisas e demais acessórios...
Bebi apenas um café e água, pois o plano era ir almoçar em Gramado.
Quando começaram as “exibições” de alguns
poucos idiotas com acelerações desnecessárias, empinos arriscados e demais
manobras sem noção eu falei:
“Rei, vamos embora, não estou a fim de ver
um provável acidente.”
“Vamos nessa”
Respondeu enquanto um de nossos amigos
disse:
“É, vamos também. Não é raro um acidente
quando começam a fazer essas babaquices.”
E saímos em direção à Gramado enquanto
eles iam encontrar suas famílias para um tradicional churrasco gaúcho.
Escrevendo esse texto, com o auxílio do
Google Maps vejo que poderíamos ter seguido em frente e feito um caminho maior
e talvez melhor, em vez de voltar por Nova Petrópolis para ir para Gramado, mas
como ninguém levantou essa possibilidade então...
Mas estávamos nas serras gaúchas sendo
assim, muitas curvas e poucas retas foi o cenário. Mais algumas obras em função
da tragédia já citada...
Chegamos e iniciamos a procura pelo restaurante
à quilo que nossos amigos haviam indicado, que esqueci o nome. Ambiente agradável,
meio rústico, bem frequentado, com excelente comida da região que logicamente repeti.
Tudo arrematado com uma excelente musse de chocolate que também repeti.
É de conhecimento geral o excelente nível
da culinária do Rio Grande do Sul. De origem italiana e alemã cujos sabores são
conhecidos mundo a fora. E não poderia ser diferente quando a união dessas duas
culturas se junta a nossa e a tradicional simpatia, bom humor e excelente atendimento
oferecidos por seus descendentes. Alia-se a isso o fato de estar desfrutando férias
ou afins. Você esquece das preocupações da vida inclusive do custo das coisas que
está consumindo nesses momentos. Uma união de fatos e sentimentos únicos e
inesquecíveis.
Saímos, atravessamos a rua e entramos
em uma cafeteria. Um expresso e um segundo porque o atendente entendera que
Reinaldo queria um. As sacanagens a cerca de futebol de praxe, muito bem
recebidas por ele e seu colega de função, mais uns minutos de bom papo, pagamos
e fomos para a rua em direção às motos fumando um “cigarrimdipaia”.
Voltamos às curvas em retorno para Nova
Petrópolis para abastecer as motos, um revigorante banho e descanso antes do
jantar.
Por indicação da atendente do hotel, andamos
poucos metros até chegarmos no Restaurante Deck. Amplo como uma belíssima
decoração rústica, possui lareiras de metal no seu interior para aquecer os
comensais em tempos de frio. Entre outros, o lugar oferece fondues variados e outros
pratos. Escolhemos o Carnes na Pedra. Bons pedaços de entrecôte bovino, filé de
alcatra, filé de frango e filé suíno, sobre uma pedra de granito quente,
acompanhados de molhos da casa em pequenos potes. Excelente pedida que supriu bem
nossos objetivos. O atendimento, como de praxe, foi muito bom. A cidade
permanecia quase que totalmente deserta...
Hotel e cama, apesar de termos rodado
muito pouco nesse dia, estávamos cansados.
Após o café da manhã, colocamos as
coisas nas motos, fizemos o check out e seguimos em direção a São Joaquim a fim
de descer novamente a Serra do Rio do Rastro em direção a Blumenau onde iríamos
pernoitar por dois dias na casa de Eduardo, um grande amigo dos tempos de
faculdade. Seriam quase 580 km que com o descanso de dois dias em Nova
Petrópolis não deveriam ser problema.
A estrada, nova para nós dois se
mostrou muito interessante, mesmo com a temperatura um pouco elevada devido ao sol
que se fazia presente quase que na sua totalidade. Nuvens branquíssimas
espalhavam-se pelo céu, mas não amenizavam em nada essa temperatura. Boas curvas
de raio longo eram uma constante que junto com o enormes pastos e plantações em
terrenos quase planos revelavam parte dos Pampas Gaúchos.
A gasolina era consumida com certa
velocidade o que me deixava apreensivo, já que não víamos postos pelo caminho. O
GPS mostrava que estávamos no caminho, mas a ausência de movimento e de sinais mínimos
de civilização contribuíam com minha preocupação. Em certo momento paramos em
uma construção precária para nos informarmos da distância para o próximo. Após
algumas batidas na porta recebemos a resposta:
“Uns 25 km à frente.”
Aliviados, seguimos apreciando com
menos parcimônia o cenário e as curvas. Mais alguns quilômetros paramos para beber
água, um café e confirmar a informação anterior. Era uma casa bastante rústica
encravada no meio do nada onde a simpaticíssima proprietária surgiu confirmando
a informação.
Nos convidou a entrar no cômodo anexo onde
havia algumas mesas como em um pequeno restaurante. Sobre uma delas haviam alguns
recipientes com arroz, feijão, carnes diversas e uma linda travessa cheia de
polentas fritas. Ao fundo a cozinha onde ela estava preparando seus quitutes...
Perguntei quem iria comer tanta comida
e ela explicou que estava fazendo quentinhas que vendia para os trabalhadores
das empresas que fazem trabalhos nas estradas e/ou propriedades da região e que
apesar de não parecer, eram muitos. Não me furtei a pedir um pedaço de polenta no
que fui bastante incentivado por sua simpatia. Sua jovem filha ouvia atenta nossa
animada conversa.
Perguntei e ela respondeu que morar
naquele isolamento todo era um sonho para ela e o marido; que estava cumprindo
seus afazeres na lida da roça. Sua filha frequenta a escola regularmente e o
movimento proveniente da venda das quentinhas quebravam a monotonia do lugar
mesmo suas tarefas sendo as mesmas diuturnamente. Era visível sua felicidade.
Poderíamos ter almoçado lá, mas ainda era cedo para isso, infelizmente.
Em poucos quilômetros chegamos a Bom
Jesus onde abastecemos. A estrada continuava vazia e não era das melhores
devido a sua aparente longevidade, mas o asfalto estava bom. As curvas e curtas
retas eram consumidas com maior prazer devido aos tanques cheios e a certeza de
estarmos no caminho certo.
Era o caminho, mas não o mais curto.
Havíamos retomado o roteiro original, voltando e só nesse momento é que iríamos
passar pela Serra do Rio do Rastro e descendo. Para isso, teríamos que chegar
em Lages, passar em São Joaquim e pela serra. Por isso, saímos de Bom Jesus, à
esquerda em direção a Vacaria o que fez aumentar a quilometragem do dia. Nesse
trecho passamos por uma ponte sobre o Rio Pelotas...
Passamos por Lages, parando apenas para
novo abastecimento. Passaríamos por São Joaquim, também sem parar a fim de
almoçar na Churrascaria da Cascata, do nosso amigo Jaime (o feliz recém pai dos
gêmeos) antes de descer pela segunda vez nesta viagem, a Serra do Rio do
Rastro.
Mas não aconteceu assim. Atravessamos
São Joaquim, onde errei o caminho. Achei estranho e parei em uma descida.
Avisei e Reinaldo desceu mais uns metros para se informar. Fiquei esperando. Ao
ver que ele retornaria, fiz o retorno e parei no cruzamento que havíamos errado,
para dobrar à esquerda. Olhei para os dois lados e saí. Não vi o carro que
vinha da direita e aí nossa viagem terminou.
Não foi uma batida forte. Isso aliado
aos equipamentos de proteção minimizaram bastante as consequências em meu
corpo. O saldo foi de contusões sem quebra de ossos nas mãos e alguns poucos
dedos e uma costela fissurada nas costas; provavelmente do choque com o baú. De
sangue apenas poucas gotas de um ferimento mínimo no indicador da mão direita.
A moto, algumas quebras e arranhões na
lateral direita, um radiador furado, uma canela (amortecedor dianteiro) empenado
assim como a traseira do chassi que também empenou. O baú foi arrancado junto
com parte da traseira onde era fixado. Outros estragos menores, tais como
piscas, protetor de mão etc. se somaram a esses...
Reinaldo que vinha atras viu tudo e
disse que o estrago teria sido menor se o motorista tivesse freado, mas não o
fez por aproximadamente 5 metros, arrastando e arregaçando a moto junto.
Ainda no chão, comecei a me mexer com
cuidado para sentir o tamanho do estrago. Conforme observava que as coisas estavam
no lugar, não sentia o tradicional quente do sangue escorrendo em algum lugar e
as dores não pareciam ser contundentes. Estava bem e aos poucos, com a ajuda de
alguém, me sentei, ainda no chão e outro alguém me ajudou a levantar. Caminhei
com dificuldade em direção a calçada voltando a me sentar encostado a uma
parede. Reinaldo perguntou se estava tudo ok dizendo que a batida havia sido
fraca pois estávamos em velocidade reduzida. Ele então ligou para Eder (o dono
da pizzaria em São Joaquim) que chegou em seguida. Falou comigo e levou a moto
embora. Eu estava tranquilo, mas chateado com o fim da viagem.

Logo chegou a ambulância cujos paramédicos
fizeram os questionamentos de praxe. Um deles perguntou meus dados e minha data
de nascimento. Perguntaram como me sentia, respondi que bem. Eles queriam me colocar
em uma maca e me imobilizar, mas disse que estava bem e não precisava. Entrei
na ambulância e o paramédico perguntou minha data de nascimento. Respondi sorrindo
dizendo:
"você já perguntou isso."
“É de propósito para ver se você está realmente
bem.”
Sorri novamente em aprovação e feliz
por isso.
No hospital, as radiografias de praxe,
sentindo que as dores aumentavam. Mas isso acontecia em grau baixo confirmando
que realmente estava bem. As radiografias não mostraram fraturas e uma injeção
aliviou as dores.
E foi na pizzaria de Eder que vi o real
estado da moto. Ele disse que a ciclística estava comprometida o que impediria
de seguir viagem. Encerrei as tratativas com o proprietário do carro e com o
seguro no final da tarde e no dia seguinte chegaria um reboque para levar a
moto e um carro para mim. Reinaldo insistiu que seguiria atras; o que seria
deveras entediante para ele.
Voltamos ao hotel onde pernoitamos dias
antes, um banho, bons minutos de descanso e fomos jantar na pizzaria do Eder.
A dor nas costas era uma constante que se
intensificava a cada movimento. Isso aliado a perda de grande parte do roteiro
da viagem traziam certa tristeza, mas o fato de o acidente ter sido em baixa
velocidade e dentro de uma cidade e não na estrada era um alívio e motivo de
agradecimento a Deus que sempre escolheu para mim as melhores formas de passar
meus perrengues. Assim foi quando fui atropelado por uma pedestre que avançou o
sinal quando eu voltava da faculdade, quando eu caí em uma curva cheia de óleo na
volta de uma balada, ou nas quedas de praxe nos tempos em que fazia trilhas nos
morros da cidade.
Neste caso, poderia ter sido na
estrada, em um dos mais de 3.500 km, em uma curva em alta velocidade, mas ele
escolheu me derrubar em uma das pouquíssimas situações da viagem em que estaria
em baixa velocidade e isso tudo não me fazia pensar nos danos materiais em
minha companheira de tantas viagens. Eu estava feliz por isso tanto que só fui
verificar os detalhes desses danos quando cheguei no Rio.
Depois do café da manhã, voltamos a pizzaria
onde iríamos aguardar o reboque. Era uma picape S10 da Chevrolet com caçamba
alongada e o motorista ofereceu que colocássemos as duas motos e seguíssemos dirigindo
até o Rio e quando chegássemos ele iria buscar o veículo. Eu e Reinaldo
conversamos e decidimos aceitar. Assim, não teríamos de conviver dois dias com
alguém que não conhecíamos. Nada contra o motorista, até porque ninguém faz uma
oferta dessas à toa e ele fez.
E assim fizemos, colocamos as motos na
caçamba, fomos almoçar no restaurante à quilo do Eder, nos despedimos de todos
e seguimos viagem com Reinaldo dirigindo. Eu queria me resguardar por mais um
dia.
Seguimos em direção a Lages. Rodamos
pouco, 280 km, saímos de São Joaquim depois do almoço e em poucos quilômetros Reinaldo
viu pelo retrovisor que uma das motos havia tombado. Paramos, mas as condições
em que eu estava não permitiram que o ajudasse a fazer um trabalho descente. Tivemos
que voltar para fixa-las melhor. Isso feito, retomamos a viagem que transcorreu
tranquilamente em uma boa velocidade.
Entretanto, quando começou a escurecer
vimos que os faróis da pick-up não acendiam, tínhamos apenas os faróis baixos.
Outro problema era a dificuldade de passar a marcha ré. Precisávamos de alguns
bons minutos para fazer essa marcha entrar. Isso deixou Reinaldo puto (😂😂😂) ele reclamava e eu dizia:
“Calma cara. Estamos voltando confortavelmente
em ambiente refrigerado, a situação poderia ser outra.”
Paramos em Papanduva, ainda em santa
Catarina, onde jantamos um delicioso hamburguer de uma bela hamburgueria local e
pernoitamos em um hotel muito bom para um beira de estrada. Eram os dois
últimos quartos livres e conseguimos uma vaga para o carro bem em frente a
recepção que funciona 24 h.
Após um bom café da manhã seguimos
viagem. Dessa vez eu estava dirigindo. Bons quilômetros depois estava tudo
parado. Ao chegarmos ao fim da imensa fila, verificamos que a pista no sentido
contrário estava completamente vazia e a nossa não andava; sinal de acidente
que não deveria ser dos pequenos. Se fosse obra, ao menos uma das pistas
estaria “andando”. Ficamos parados por quase uma hora conversando com outros
motoristas.
Recomeçamos a andar e em pouco tempo
vimos um caminhão capotado e atravessado na pista que os funcionários da
concessionária tinham acabado de mover abrindo uma passagem e por sorte a nossa
pista foi a primeira a ser liberada.
Passamos por Curitiba quando
verificamos que a mesma moto havia tombado novamente. Paramos em um posto a
procura de um caminhoneiro que pudesse nos ajudar. Eu ainda sentia dores e
Reinaldo sozinho não resolveria o problema.
Encontramos Marcos, muito gente boa que
refez a “porratoda” com bom humor. Bebemos um refrigerante, batemos um bom papo
e seguimos viagem.
Com exceção dos problemas do carro,
tudo transcorreu muito bem. Andávamos em boa velocidade, a estrada, Régis Bitencourt,
duplicada e em excelente estado, um número considerável de boas curvas...
Estava gostando de voltar a dirigir carro em estrada, mesmo esse carro
problemático.
Passamos por São Paulo. São Paulo é
aquilo, trânsito pesado, indicações nada precisas e confiáveis por isso
perdemos o acesso ao rodoanel. As placas não mostram bairros ou cidades e sim
ruas, avenidas, pontes, viadutos e estradas. Quem não mora lá e não souber por
exemplo, que a Trabalhadores é a Ayrton Senna e que vai para Taubaté está
ferrado. Eu sou um deles...
E assim fomos até chegar na boca da Via
Dutra. Novamente estava tudo parado. Mais de uma hora em: primeira – ponto morto,
primeira – ponto morto, primeira – ponto morto...
Mas eu estava tranquilo. Decidimos
pernoitar logo que saíssemos de São Paulo; estava escurecendo e sem faróis...
À nossa esquerda uma grande obra nos
acompanhava. Novas pistas viadutos etc. O governador Tarcísio está fazendo
muito. Ao chegarmos na Dutra, passava apenas um carro. Imaginem...
Pegamos a rodovia e o movimento
melhorou sencivelmente. Já era noite e rodamos alguns quilômetros até pararmos
em um Graal em Guararema, a fim de jantar. Boa comida ambiente limpo e bom atendimento.
Não havia quartos no hotel próximo,
seguimos até Jacareí onde pernoitamos. Outro bom hotel com excelente café da
manhã.
E seguimos viagem até chegarmos em
casa, sãos e salvos. Deixamos minha moto na concessionária e fui para casa.

Apesar do perrengue do acidente, essa
foi uma das melhores das sete viagens feitas até agora. O roteiro escolhido nos
permitiu percorrer novas estradas em excelente estado de conservação. A
sinuosidade das curvas e as poucas retas percorridas, neste quesito, fizeram
desta a melhor de todas as viagens, mesmo sabendo que havia muito mais curvas a
degustar. Afinal deixamos de passar por serras do Rastro da Serpente e Dona
Francisca entre outras. Foram onze dias de tempo bom, poucas chuvas e prazeres
vividos que estarão muito bem guardados na memória. Soma-se a qualidade dos
pneus, as velocidades atingidas em cada trecho, as conversas com boas pessoas,
o visual deslumbrante da região e a comida impar característica de cada parada;
tornaram a aventura única e nos deixou a certeza de que esse será o roteiro da
próxima, quando estarei pronto para iniciar um novo relacionamento com uma nova
companheira que já está em vista. Aguardo apenas o fim dos trâmites referentes
ao seguro.
Não estou com pressa, tenho quase um
ano para conhece-la, conquista-la e iniciar o processo de simbiose necessário
ao novo relacionamento.
Da anterior fica a saudade de mais de 80.000
km vividos em intensidade ímpar. Foram bate e voltas homéricos e sete longas viagens
inesquecíveis que me proporcionaram momentos valorosos em que ela nunca me
deixou em situação difícil. Isso tudo ratifica meu amor por duas rodas e deixa
a certeza de que não irei parar tão cedo.
Desejo apenas que eu tenha saúde física
e financeira para novas aventuras e que sejam muitas.
Forte abraço e até a próxima!!!
DADOS TÉCNICOS
- Dias de viagem (18/10 à 28/11/210 - 11 dias
- Quilômetros percorridos - 3.534 Km
- Combustível (gasolina comum - Moto) - R$ 1.132,53
- Combustível (díesel – Pick-up) - R$ 681,43
- Pedágio - R$
181,80
- Hospedagem - R$ 2.108,00
- Alimentação (comida e bebidas) - R$ 1.704,84
- Outras despesas (concessionária, Uber,
miudezas etc.) - R$ 946,60
- TOTAL - R$ 6.755,20