PAPO RETO, CURTO, IRÔNICO, AS VEZES GROSSO, MAS NUNCA MAL EDUCADO. LÊ AÍ E DÊ SUA OPINIÃO E QUE SEJA SINCERA, POIS DE GENTE BOAZINHA O INFERNO ESTÁ CHEIO.
sábado, 23 de outubro de 2010
VISITANDO O VAZIÃO
Faltam um pouco menos de vinte e quatro horas para o primeiro Clássico dos Milhões a se realizar no Engenhão. E eu não vou!
Como pode, um frequentador assíduo dos jogos do Mengão não poder estar presente? Isso é uma heresia das grandes.
Como eu gostaria de estar lá!
Mas é impossível! Racionalmente impossível! Podem me chamar de elitista, de reacionário, etc. fôda-se! O que importa é minha segurança, meu conforto, etc.
Queria muito de ir, meu filho também. Estou com saudades de ver ao vivo e a cores o Mais Querido desfilar pelos gramados, ainda mais em uma situação que promete uma vitória sobre, como muito bem define um Rubro-Negro de responsa (Arthur Muhlenberg) os sempre Vices, nossa eterna “Baranga de Fé”.
O jogo promete e minha vontade de ser mais uma “testemunha ocular da história” é grande, mas minha porção racional e inteligente não me permite fazer tal idiotice.
Vou ter de me contentar com uma LCD de quarenta e duas polegadas pendurada em uma das paredes do boteco aqui perto de casa. Não tenho PFC, pois como disse sou freqüentador assíduo dos jogos do Flamengo. Menos mal que vou ter a companhia do meu filho e de uma loura geladíssima, mas vou ter de ficar ouvindo muita besteira dos presentes.
Há outro agravante, a possibilidade de ficar a menos de três metros de um dos poucos torcedores do freguês que terão coragem de botar a cara. Coisas da vida.
Mas qual o motivo dessa impossibilidade? Bom, vou contar uma das maiores e decepcionantes aventuras da minha vida:
Há dias procurava informações. Nunca havia ido lá e, devido à qualidade da segurança de nossa cidade, estado e país. Ir ao Engenhão ver um jogo do Flamengo não ia ser uma das tarefas mais fáceis.
Por diversos motivos, profissionais, sociais etc., andei por vários bairros da cidade e municípios do estado e sempre me saí bem. Me perdia em alguns momentos e quando isso acontecia, logo me encontrava pois, ao contrario do que dizem da maioria dos homens não vejo nenhum problema em parar para perguntar onde estou.
Dessa forma, chegar eu sabia chegar. Restava escolher uma das opções:
Linha Vermelha e depois Linha Amarela seria talvez a mais rápida e segura. Segura?
Av. 24 de Maio a mais conhecida para mim.
O problema seria onde parar o carro. Perguntei a alguns que sabia já terem ido, mas as informações não foram animadoras. Um havia ido à época dos Jogos Pan-americanos. Sei que nessa época tudo funcionava de maneira satisfatória para atender aos turistas e jornalistas estrangeiros que não poderiam sair com uma imagem negativa da Cidade Maravilhosa.
Não estávamos mais em época de Pan muito menos de eleições.
Outro esteve lá logo após o Pan, no primeiro jogo depois que o estádio fora arrendado, portanto ainda havia algum resquício de segurança daquela época.
O terceiro havia ido de metrô e depois trem ver um jogo do time arrendatário do Estádio contra outro time pequeno. Ou seja, jogo de uma torcida só e essa, cabe em uma Kombi.
O quarto, meu parceiro de Maraca que foi levar seu único filho (que se continuar como está, vai solicitar sua vaga na Kombi), deixou o carro num terreno da Cia de trem por módicas vinte pilas.
Não queria perder a oportunidade de conhecer o tão falado Engenhão. O jogo ia passar na TV, mesmo assim, me enchi de coragem, fomos, sem ingressos, que normalmente compro com antecedência. Seguimos para o ponto de ônibus iniciar o que imaginava ser uma oportunidade de mostrar na prática a meu filho que o Brasil não se resume apenas à zona sul do Rio de Janeiro. Coisa que ele já sabia na teoria.
O tempo não era dos melhores, apesar de meio nublado o calor era infernal. A umidade do ar piorava a situação. Havíamos almoçado em casa aquele tradicional arroz, feijão, bife com batatas fritas, feitos pelas doces mãos de minha Babá. Há muito meu filho não aparecia o que a fez cozinhar com mais amor.
O ônibus do metrô chegou em seguida o que me deixou menos receoso. Estava começando bem.
Era Carnaval e algumas pessoas fantasiadas entraram indicando a possibilidade de sermos atrapalhados por um bloco de foliões o que poderia piorar nossa situação, pois estávamos no limite de tempo.
Chegamos à estação de Botafogo e entre idas e vindas de diversos foliões em variados níveis alcoólicos entramos no primeiro vagão enquanto as portas fechavam à nossas costas.
Notei que não éramos os únicos loucos diminuindo minha preocupação.
Os vagões sempre limpos em dias normais estavam irreconhecíveis, fruto da falta de educação de certos elementos.
Não lembrava onde seria a melhor saída da estação Central do Brasil então resolvi ir trocando de vagão até o centro onde estaria eqüidistante das extremidades e se tivesse sorte a saída seria no meio.
Estava dando tudo certo. Subimos a escada rolante e logo nos encontrávamos em um enorme saguão lotado onde os funcionários da empresa que administra (?) aquilo davam informações incorretas mostrando seu preparo.
Sempre na dúvida e com uma enorme sorte deduzimos que não deveríamos perder tempo consultando o painel que informava as horas e plataformas das chegadas e partidas daquelas coisas que chamam de trens.
Preocupado em não furar filas, escolhemos a plataforma onde havia mais pessoas com o Manto Sagrado. À esquerda repousava aquilo que restava de uma composição que como um Trem Fantasma, inexplicavelmente abria e fechava as portas. As pessoas entravam e saíam como que perdidas. Foi aí que percebi que não havia ninguém num raio de cinqüenta metros que não estava buscando desesperadamente por uma informação.
Nos aproximamos de um grupo que parecia saber onde estava. Ledo engano. Conversamos um pouco e, vendo que não ia resolver me virei em busca de pelo menos uma bússola. Voltar para casa ainda não havia passado pela minha cabeça.
A uns vinte metros avistei um funcionário da limpeza, sim havia um e educado.
“Hoje todos os trens são paradores (param em todas as estações) o senhor pode pegar qualquer um e descer na Estação Engenho de Dentro.”
Voltei, informei ao grupo de perdidos como eu que o funcionário havia sido bastante convincente.
Eles entraram em seguida naquele resquício de trem. Nos sentamos próximo a porta e logo descobri como se sentiam os patês em suas latas. Há muito, desde a época de estagiário, não me sentia assim.
Em pé, à nossa frente estava uma senhora para quem em condições normais ofereceria meu lugar, mas não seria naquele dia que seria politicamente correto. Não sou perfeito. Não iria correr o risco de perder meus poucos pertences em um possível furto. Ela demonstrava estar familiarizada com aquela situação.
Na porta, literalmente, que mantinham aberta um grupo de não mais que sete (conta de mentiroso) rapazes (?) entoavam cânticos de sua facção de uma das torcidas organizadas. As letras eram extremamente educativas, incentivavam a violência contra torcidas de times rivais, passando pelo incentivo à quebra do estádio (apenas por ter sido arrendado por um Clube rival esquecendo-se, demonstrando sua inteligência, que foi construído com seu próprio dinheiro), culminando com o incentivo a violência contra outra torcida organizada, pasmem, do próprio Flamengo.
Próximo, uma foliã, que voltava para casa acompanhada de sua turma cantava e bebia aquela que parecia ser sua centésima cerveja da tarde. Assim continuou mesmo depois de jogar, as gargalhadas, a latinha, ainda com líquido, pela janela do trem em movimento.
Mas eu estava achando ótimo, meu filho estava tendo a oportunidade de aprender coisas que não conseguiria fazê-lo entender nem com semanas de papo. Várias aulas de matemática, português, etc. não fariam tanto efeito quanto aquela aventura que estava começando.
A vida, ou melhor, a verdadeira vida estava passando nua e crua diante de seus olhos azuis sem que eu precisasse mencionar se quer uma palavra. Só o fazia quando ele ficava, na sua inocência, encarando os sete “Poetas”.
“Não fique olhando muito, você não sabe o que pode sair da cabeça dessa turma.”
Mas não era só ele que estava tendo aulas, eu estava fazendo uma reciclagem em alguns de meus conceitos. Aquele workshop estava me permitindo esclarecer, por exemplo:
“Por que os policiais são tão estúpidos e ignorantes quando nos abordam?”
Eles têm que conviver com esse tipo de gente toda hora e muitos não tem inteligência suficiente para distinguir o cidadão que trabalha e paga imposto do vândalo. E têm muito medo do segundo.
“Por que as pessoas que moram longe estão quase sempre com os nervos a flor da pele?”
Eles têm que acordar de madrugada, adivinhar e esperar o trem, e dentro deles, como sardinhas, viajar por horas para, muitas vezes, aturar aquele patrão manda chuva que chega de carrão com ar-condicionado e motorista e, como se não fosse suficiente, ao final do expediente fazer o caminho inverso para chegar sei lá que horas em casa.
Etc.
Depois descobri que a opção ônibus não teria sido é mais confortável.
Chegamos, aceitamos a sugestão do funcionário e compramos os bilhetes da volta. Recusei a primeira oferta de um cambista, mas não recusei a segunda após avistar a confusão que reinava na bilheteria.
Essa outra atitude incorreta se mostrou providencial ao atravessamos a roleta, ao mesmo tempo em que a torcida denunciava a entrada em campo do Mais Querido.
O estádio é muito bonito, um verdadeiro monumento que como tal perde a função do seu objetivo.
A visão é péssima. Talvez, do nível superior a visão seja melhor, mas deve ser desconfortável pelo grau de inclinação da laje. Nesse local as cadeiras tem uma barra na frente destinada a pessoa se segurar para não sair rolando arquibancada abaixo.
Mas é lindo! Como se essa fosse a função mais importante dessa construção. Aliás, no Brasil existem muitas obras cuja função não é mais importante que a necessidade de ser belo. E assim nossa grana vai sendo gasta com essas porcarias.
O jogo, contra o América, transcorria dentro da normalidade; gols perdidos, as tradicionais incompetências da arbitragem, calor, cerveja quente, banheiros bem acabados, porém imundos, água das torneiras com uma coloração especial, marrom... calor...
A normalidade permanecia até a entrada de Obina, que depois de algumas trapalhadas conseguiu fazer três gols. Juan, que jogava mal, também fez o dele, fechando a parte anormal do jogo.
Saímos após o terceiro gol a fim de poder chegar ao trem sem tumulto.
O funcionário da estação ficou olhando para mim com cara de bobo quando perguntei qual a plataforma ir. Sem resposta, já escolado, perguntei para uma funcionária que me parecia mais ativa e responsável.
“Plataforma B2”
“Obrigado”
Por mais de trinta minutos permanecemos junto a outros aguardando nosso transporte para casa.
A chuva fina dava o ar de sua graça e era bem vinda.
Enquanto isso na B3 um trem nunca saía.
Ele saiu, na direção da Central, nosso destino...
Outras composições partiam da B3 no mesmo sentido...
Ao ser abordado um funcionário não soube explicar a causa daquilo e após alguns minutos ao celular informou que a próxima composição para a central iria sair de lá, B3.
Trocamos de plataforma não sem antes verificar que a funcionária da primeira informação havia desaparecido estrategicamente.
Após vinte minutos chegou o trem que partiu após uns quinze.
Menos cheio nos permitiu vislumbrar o entorno da linha limitada pelos altos muros que escondiam os efluentes da “civilização”. Entulho de diversas obras, lixo variado, restos de feiras e mato alto era o cenário e bichos errantes seus habitantes.
Uns dormiam embalados pelo gingado do trem enquanto outros discutiam os lances do jogo.
Nós conversávamos sobre a experiência que dificilmente será repetida...
O parador nos deixou próximo a civilização em aproximadamente 40 minutos.
Descemos as escadas rolantes que estavam desligadas e em quanto aguardávamos nosso metrô, o que seguia na direção oposta chegou e abriu suas portas como de praxe. De dentro as pessoas saiam com violência em quanto outras caiam pela plataforma como bananas podres empurradas por seus pares de bloco. Os que empurravam riam como hienas. Desculpem hienas pela comparação. A aula continuava, mas estava por terminar.
O ar condicionado se mostrava especialmente frio, o vagão agradavelmente vazio e nos sentamos sem problemas. A sujeira ainda presente agora quase sem ser percebida e em menos de meia hora o ônibus do metrô nos aguardava no ponto.
Chegamos em casa passando pelo imponente Parque Laje quando comecei a agradecer pelas minhas conquistas. Meu filho fez o mesmo agradecido pela experiência.
Saúdo, mas não invejo os Heróis que farão essa jornada. Talvez as coisas tenham melhorado, mas o risco de presenciar uma briga entre torcidas “organizadas”, de ser confundido com um dos membros educadíssimos de uma delas ou de ser alvo de um de nossos preparadíssimos representantes da lei, não me animam a sair de casa.
Àqueles que forem fortes, desejo boa sorte, que vão em paz e que o Senhor vos acompanhe. Vão precisar.
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Poxa, que pena que vc teve uma experiência ruim. Bom, eu vou de carro, o que, sem dúvida, é mais fácil. Dá uma olhada nesse texto aqui: http://flamengoaspirinaseurubus.blogspot.com/2010/09/pontos-negativos-e-pontos-positivos_20.html
ResponderExcluirAcho bacana a gente dividir essas experiências.
SRN
@NivinhaFla
www.flamengoaspirinaseurubus.blogspot.com