Porque eu nunca escrevi sobre motos, aqui? Como pode, eu uma pessoa que gosta muito desse meio de transporte, ainda não ter feito um único texto sobre esse assunto? A situação torna-se mais estranha ainda se considerarmos que minha infância foi quase toda percorrida sobre duas rodas. Está certo que era uma bicicleta, mas já era um começo.
Morava em uma rua sem saída em Botafogo e entre as peladas, pique esconde, pique bandeira, pique pega, vôlei, etc. andar de bicicleta era nossa brincadeira preferida.
Não posso esquecer que, já morando no Jardim Botânico, meus primeiros metros dirigindo uma dessas máquinas foram feitos quando tinha apenas uns 13 anos.
Não era bem uma motocicleta, mas uma bicicleta motorizada, ou seja, uma Velosolex.
Era de um então grande amigo que com mais outros dois alternávamos voltas pelas ruas do bairro.
Foi nela que conheci o dor de um bom tombo, mas foram apenas algumas escoriações, nada de grave. Era comum me machucar nas brincadeiras e as diversas marcas em meus joelhos são a prova de uma infância muito bem vivida.
Coitadas das crianças de hoje que não possuem essas marcas.
Os anos foram passando e com aproximadamente quinze anos, aos trancos, percebi a diferença entre o ter e não ter marchas, o porque de manter a embreagem acionada quando desejar ficar parado e a intensidade com que se deve soltá-la para iniciar o movimento.
Era uma Yamaha RD 50 azul de outro amigo que os pais irresponsáveis permitiam usar sem ter idade para tal.
A vontade de ter a minha própria moto crescia, mas as circunstâncias econômicas e severidade de meus pais não me permitiam sonhar tão alto.
Enquanto isso, via desfilar pelas ruas do Rio de Janeiro máquinas possantes. As japonesas importadas por serem mais populares, eram as mais freqüentes em meus sonhos.
Não era um amor incondicional ao ponto de me tornar cego as outras opções, portanto, os carros ocupavam a outra metade de meu coração assim como do cérebro e os sonhos produzidos por ambos.
Apenas nos anos 80, já na faculdade de Arquitetura, que consegui realizar meu desejo. Trabalhava como inspetor em um colégio em Ipanema e troquei meu Chevette (um grande companheiro de aventuras) por uma Yamaha DT 180, a primeira moto trail lançado no Brasil..
Era branca com detalhes em azul e vermelho. Os pára-lamas altos e sua suspensão traseira com apenas um amortecedor eram a sensação da época.
Foram anos de muita diversão. Foi nessa época que iniciei minhas aventuras “off-road” e me tornei um trilheiro mediano.
Ir às festas, bares, praias e demais compromissos da juventude tinha ficado mais agradável e rápido. As meninas na garupa era outro ganho. De negativo apenas o risco de uma queda o que para seres desprovidos de razão não chegava a ser algo a se considerar. Vide meus joelhos.
Foi exatamente aí que me estrepei pela segunda vez.
Voltava da faculdade, umas 23 horas e aproximava-me de um cruzamento. O sinal estava aberto para mim. Vi que na calçada a esquerda uma mulher se preparava para atravessar a rua. Pensei:
“Se ela for daquelas pessoas que gostam de atravessar tirando um “fino” do veículo, estou ferrado.”
Joguei o máximo que pude para a direita e enfiei o dedo na buzina, na esperança de fazê-la perceber minha presença. Ela poderia:
1 – ter se assustado, paralisado na calçada e me xingado;
2 – não ter tomado conhecimento, continuado andando, deixando espaço mínimo suficiente para a minha passagem e me xingado;
3 – qualquer uma das opções acima e não ter me xingado.
Mas não, a FILHA DA PUTA, desculpe, mas não tem outro adjetivo, escolheu a única opção cujo resultado seria trágico.
ELA CORREU!!!!!
Ela correu e me atingiu, ou seja, me atropelou. Ela LITARALMENTE me atropelou!
Ela “parou” a moto com o corpo, eu saí voando por cima, caí arrastando a cara no asfalto, a moto (após uma cambalhota no ar) caiu por cima de mim e ela ... Ora! Sei lá dela!
Deve ter sido uma queda de uma plástica inigualável.
Resumo, hospital, alguns poucos pontos, outras escoriações, o prejuízo da moto e o pior, o susto que minha mãe levou ao me ver chegar em casa, todo rasgado e sujo de sangue.
Os dias continuaram passando e logo melhorei.
Nas férias seguintes conheci uma gaucha linda. Curtimos muito os quase três meses deste período de folga letiva. Fizemos passeios, viagens, fomos a diversas praias, saímos nas noites, etc. Aquele seria seu último dia na Cidade Maravilhosa.
Voltávamos da noite que havia sido maravilhosa e já era dia. No Cosme Velho, descendo em direção ao Flamengo, conversávamos tranquilamente. A velocidade era baixa, queria curtir aqueles últimos momentos juntos.
Curva pra lá, curva pra cá e ZAPT! A moto sai de baixo de nós e vai parar junto ao meio fio.
Levantei com a lateral da perna esquerda totalmente em carne viva. No joelho da mesma perna um buraco com aproximadamente 4 centímetros de diâmetro e meio de profundidade.
Ela estava menos machucada, mas chorava de dor.
Levantamos com dificuldade, verificamos os estragos e seguimos calados até onde estava hospedada. Ela não quis ir para o hospital, eu também não.
Para ela seriam quase 48 horas de sofrimento em uma viagem de ônibus até Porto Alegre.
Para mim, alguns dias de cama cuidando dos ferimentos.
Para minha mãe, mais um susto.
Moto consertada, volta as aulas e a rotina de sempre.
Até que enchi o saco, vendi a moto e comprei outro Chevette.
Passaram-se anos, eu já estava casado e com filhos quando no aniversário de um amigo que não via há anos ele, junto com outro amigo, me convenceu a arrumar uma moto para acompanhá-los pelas delícias das trilhas da vida.
Seqüestrei uma outra DT 180 que meu irmão mantinha em Niterói e junto com os dois amigos e um vizinho (esse, tarado por motos) de prédio retomei os prazeres de trilheiro.
O equipamento providencialmente adquirido me salvou em várias situações e minha prudência natural ajudou bastante.
A moto, além do resgate no tempo, me proporcionava um prazer indescritível, apesar de pequena para meu tamanho. Sua leveza permitia manobras mais radicais e seu motor devidamente “envenenado” era muito potente.
Foram fins de semanas fantásticos ao ponto de, em um ano, me fazer buscar um up-grade e partir para uma Suzuki DR 350.
Vender a DT 180 não renderia nenhum dinheiro significativo, pois o valor de mercado era bastante inferior ao excelente estado em que se encontrava. Isso me fez antecipar a apresentação do esporte a meu filho que iniciou suas primeiras travessuras nessa moto, aos 14 anos.
Nesse meio tempo, uma mudança de local de trabalho me “obrigou” a comprar uma Honda XR 250 Tornado, para ir ao trabalho, já que me recusava terminantemente a sacudir diariamente dentro de um ônibus pelas ruas esburacadas da cidade do Choque de Ordem.
A presença de meu filho e sua evolução técnica me incentivavam, aumentando nossa freqüência pelas trilhas de Vargem Grande e adjacências.
A Suzuki era uma moto excepcional que em baixas rotações ultrapassava com facilidade os obstáculos como um trator. Mas era pesada e não tinha partida elétrica o que me deixava extenuado ao fim de cada trilha percorrida.
Em uma repentina oportunidade adquiri uma Honda CRF 450 com partida elétrica, o real motivo dessa compra.
Não demorei a me adaptar, mas um problema no motor de arranque me deixava na mão com freqüência. Isso me aborrecia bastante e a demora em encontrar a solução aliado a gradativa desistência de meu filho em praticar o esporte foi minando minha vontade e em um ano me aposentei.
Mas não desisti das motos, apenas direcionei o foco para outro tipo de utilização. Sempre gostei de viajar e sempre desejei fazer viagens de aventura. Sonho em comprar um caminhão médio e adaptá-lo, com cama, banheiro, uma pequena cozinha e lógico, um espaço para uma moto. Sair por aí sem destino, curtindo a vida.
Com o tempo, tive acesso mais detalhado as BMWs, principalmente as GS 1200 largamente utilizadas em longas expedições pelo mundo a fora e esse se tornou meu mais recente sonho.
Já combinamos, eu e aquele meu vizinho, o tarado por motos citado no início desse texto, que no máximo quando nos aposentarmos vamos cada um comprar uma e realizar mais esse sonho. Falta pouco, MUITO POUCO!
Eu adoro um conto. Ganhou minha simpatia tua história com motos, apesar de eu não me adaptar a elas. Espero que tenha passado bastante da fase de ralar os joelhos.. -*
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